A morte emendou a gramática. Morreram Carlos Drummond. Não era um só. Eram tantos. Se vivo estaria às portas do seu centenário. Mas quem disse que Drummond morreu? E que ironia! Alguém tão cético provando que há vida após a morte! Mais do que qualquer outro gênio soube ser reconhecido enquanto vivo e não se deixar morrer mesmo negando os convites para se tornar imortal como membro da Academia Brasileira de Letras.
Tímido e recatado como bom mineiro, conta-se nos dedos as vezes que encarou uma câmera. Sua vida está em seus versos. O hábito de sofrer, que tanto me diverte / é doce herança itabirana. Filho do fazendeiro Carlos de Paula Andrade e D. Julieta Augusta Drummond de Andrade, nascido em Itabira do Mato Dentro, Minas Gerais, a 31 de outubro de 1902, nunca foi dado aos cuidados da terra e desde muito cedo deu preferência às letras.
Foi aluno interno do Colégio Arnaldo, da Congregação do Verbo Divino, em Belo Horizonte.
Interrompeu os estudos no segundo período escolar em 1916 por problemas de saúde. No ano seguinte teve aulas particulares e em 1918 foi aluno interno do Colégio Anchieta, da Companhia de Jesus, em Nova Friburgo. Em 1920 foi expulso por “insubordinação mental” e do colégio guardou o modo de andar com os braços colados às pernas e a cabeça baixa.
Cursou Farmácia em Belo Horizonte para onde a família se mudara em 1920. Em 1924 envia carta a Manuel Bandeira manifestando sua admiração pelo poeta. É também neste ano que conhece Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral.
No início dos anos 20, o jovem Drummond participava do Jornal Falado do Salão Vivacqua. Tratava-se de saraus idealizados por Mariquinhas, uma das filhas de Antônio Vivacqua. A família, natural do Espírito Santo, havia se mudado para Belo Horizonte porque o poeta Achilles, um dos filhos de Antônio, estava com tuberculose e o ar da capital mineira era recomendado para o tratamento da doença. A beleza, inteligência e senso de humor de Mariquinhas logo cativaram Drummond. O namoro na praça era acompanhando por duas irmãs mais novas de Mariquinhas: Eunice e Dora, que anos mais tarde viria a se transformar em Luz del Fuego. O romance não foi muito longe. Em uma noite entediante, Drummond e o amigo Pedro Nava imaginaram uma forma de as irmãs Vivacqua (seis belas moças, além das três crianças Eunice, Cléa e Dora) “saírem à rua de camisola, feito libélulas esvoaçantes”.
Com um pedaço de papel, atearam um foguinho na seteira do rés do chão que ficava sob o quarto das moças. O fogo se alastrou, tomando conta de todo o porão da casa. Esquecidos das poéticas libélulas, os apavorados incendiários deram eles mesmos o alarme e ajudaram a apagar o incêndio” (in Luz del Fuego - A bailarina do povo, de Cristina Agostinho, Editora Best Seller). A brincadeira foi perdoada por Aquilles e Mariquinhas, mas Antônio Vivacqua proibiu os encontros da filha com Drummond.
Em 1925, Mariquinhas casou com um poeta fluminense e Drummond casou com Dolores Dutra de Morais. o poeta voltou para Itabira sem interesse pela profissão de farmacêutico e sem conseguir se adaptar à vida de fazendeiro. Dois anos depois, nasce seu filho Carlos Flávio, que só viveu por alguns instantes. Em 1928 publica na Revista Antropofagia, de São Paulo, o poema No meio do caminho, que se torna um verdadeiro escândalo literário. No mesmo ano nasce sua filha Maria Julieta. Filha única e sua grande paixão, Maria Julieta seria sua eterna musa, um verso meu, iluminando o meu nada, diria no poema A mesa. A cumplicidade entre os dois existia no mais singelo olhar e também na vocação. Escritora, Julieta jamais conseguiria destaque, sufocada pelo sobrenome famoso que carregava.
Alguma Poesia, seu primeiro livro, foi editado em 1930. Foram apenas 500 exemplares. Em 1931, morre seu pai, aos 70 anos. Três anos depois transferiu-se para o Rio de Janeiro e não mais voltou a sua cidade natal: Itabira é apenas uma foto na parede / mas como dói!
Drummond conseguia, a um só tempo, ser Chefe de Gabinete do ministro Gustavo Capanema, do Estado Novo, e usar suas palavras para destruir o capitalismo. Do gabinete ministerial, saiu direto para a condição de simpatizante do Partido Comunista Brasileiro. Agnóstico, conseguia clamar aos céus uma ajuda aos irmãos necessitados numa prece bem brasileira: Meu Deus,/ só me lembro de vós para pedir,/ mas de qualquer modo sempre é uma lembrança./ Desculpai vosso filho, que se veste/ de humildade e esperança/ e vos suplica: Olhai para o Nordeste/onde há fome, Senhor, e desespero/rodando nas estradas/entre esqueletos de animais.
O modernismo e estilo de Drummond levou-o, com sua linguagem em diferentes ritmos, à popularização em um país onde se lê pouco. No meio do caminho tinha uma pedra/ tinha uma pedra no meio do caminho ou E agora, José?/ A festa acabou/ a luz apagou/ o povo sumiu são versos que entraram para a História como ditos populares. Mantém-se presente no linguajar popular de forma excepcionalmente bela: Mundo mundo vasto mundo/ se eu me chamasse Raimundo/ seria uma rima, não seria uma solução.
A morte, assim como o humor, foi uma constante em sua obra:
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
preferiram (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Misturou o amor e a doença que levou sua filha com seu típico humor em Versos Negros (mas nem tanto): O amor, então, é a grande solução?/ Amor, fonte de vida... Essa é que não./ Amor, meu Deus, amor é o próprio câncer.
Em 1982 completa 80 anos. São realizadas exposições comemorativas na Biblioteca Nacional e na Casa de Rui Barbosa. Recebe o título de doutor honoris causa pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. No ano seguinte declinaria do troféu Juca Pato. Em 1984 assina contrato com a Editora Record, após 41 anos na José Olympio.
A escola de samba Estação Primeira de Mangueira o homenageia em 1987 com o samba-enredo O reino das palavras e é campeã do carnaval carioca. No dia 5 de agosto morre a mulher que mais amou, sua amiga, confidente e filha Maria Julieta. Desolado, Drummond pede a sua cardiologista que lhe receite um “infarto fulminante”. Apenas doze dias depois, a 17 de agosto de 1987, Drummond morre numa clínica em Botafogo, no Rio de Janeiro, de mãos dadas com Lygia Fernandes, sua namorada com quem manteve um romance paralelo ao casamento e que durou 35 anos (Drummond era 25 anos mais velho e a conheceu quando ele tinha 49 anos). Era uma amor secreto, mas nem tanto. Lygia contaria ao jornalista Geneton Moares Neto (a quem Drummond concedeu sua última entrevista) que “a paixão foi fulminante”.
O poeta mineiro deixou livros inéditos que foram publicados postumamente pela Editora Record: O avesso das coisas (1987), Moça deitada na grama (1987), O amor natural (1982) e Farewell (1996).
A obra
Drummond foi poeta e prosador. A vasta riqueza de seus escritos reúne publicações 1930 a 1986.Para efeitos de estudo, sua obra foi organizada em quatro fases, que são: fase gauche (1930-1956), fase social(1940-1945), a fase do não (anos 50-60), e a fase da memória (anos 70-80). Certas características se encontram por toda sua obra: a metalinguagem e a ironia, o que faz com que CDA seja sempre comparado com seu autor favorito: Machado de Assis.
Da primeira fase, destaca-se seu primeiro livro, Alguma Poesia (1930) e Brejo das almas (1934). Nelas, se encontram certas atitudes relacionadas à primeira geração modernista: ironia, humor, síntese, poema-pílula, mas, principalmente, o que marca essa fase é o gauchismo, o ser às avessas, o torto.
Em seu conjunto, a obra de Drummond forma um todo coerente, onde as mudanças não ferem os princípios lançados em seu livro de estréia.
Bibliografia
A bibliografia abaixo apresentada é referente às edições brasileiras da obra de Drummond. Está disposta conforme publicada no livro O amor natural (Editora Record, 1992), acrescida de outros três livros posteriores ao citado.
POESIA
• 1930 - Alguma poesia
• 1934 - Brejo das almas
• 1940 - Sentimento do mundo
• 1942 - José
• 1945 - A rosa do povo
• 1948 - Novos poemas
• 1951 - A mesa
• 1951 - Claro enigma
• 1952 - Viola de bolso
• 1954 - Fazendeiro do ar
• 1955 - Soneto da buquinagem
• 1957 - Ciclo
• 1959 - A vida passada a limpo
• 1962 - Lição de coisas
• 1964 - Viola de bolso II
• 1967 - Versiprosa
• 1967 - José & outros
• 1968 - Boitempo & A falta que ama
• 1968 - Nudez
• 1969 - Reunião
• 1973 - As impurezas do branco
• 1973 - Menino antigo (Boitempo II)
• 1977 - A visita
• 1978 - O marginal Clorindo Gato
• 1979 - Esquecer para lembrar (Boitempo III)
• 1980 - A paixão medida
• 1983 - Nova reunião
• 1984 - Corpo
• 1985 - Amar se aprende amando
• 1986 - Tempo vida poesia
• 1988 - Poesia errante
• 1996 - Farewell
Antologias poéticas
• 1956 - 50 poemas escolhidos pelo autor
• 1962 - Antologia poética
• 1971 - Seleta em prosa e verso
• 1975 - Amor, amores
• 1982 - Carmina Drummondiana
• 1987 - Boitempo I e Boitempo II
Infantis
• 1983 - O elefante
• 1985 - História de dois amores
Edições de poesia reunida
• 1942 - Poesias
• 1948 - Poesia até agora
• 1954 - Fazendeiro do ar & Poesia até agora
• 1959 - Poemas
• 1969 - Reunião
• 1983 - Nova reunião
• 1997 - Coleção Verso na Prosa Prosa no Verso
• 1997 - Coleção Mineiramente Drummond - A palavra mágica
PROSA
• 1944 - Confissões de Minas
• 1945 - O gerente
• 1951 - Contos de aprendiz
• 1952 - Passeios na ilha
• 1957 - Fala, amendoeira
• 1962 - A bolsa & a vida
• 1966 - Cadeira de balanço
• 1970 - Caminhos de João Brandão
• 1972 - O poder ultrajovem e mais 79 textos em prosa e verso
• 1974 - De notícias & não-notícias faz-se a crônica
• 1977 – Os dias lindos
• 1978 - 70 historinhas
• 1981 - Contos plausíveis
• 1984 - Boca de luar
• 1985 - O observador no escritório
• 1987 - Moça deitada na grama
• 1988 - O avesso das coisas
• 1989 - Auto-retrato e outras crônicas
CONJUNTO DE OBRA
• 1964 - Obra completa
ANTOLOGIAS DIVERSAS
• 1965 - Rio de Janeiro em prosa & verso (em colaboração com Manuel Bandeira)
• 1966 - Andorinha, andorinha, de Manuel Bandeira
• 1967 - Uma pedra no meio do caminho (Biografia de um poema. Com estudo de Arnaldo Saraiva)
• 1967 - Minas Gerais
ANTOLOGIAS DIVERSAS
• 1962 - Quadrante
• 1963 - Quadrante II
• 1965 - Vozes da cidade
• 1971 - Elenco de cronistas modernos
• 1972 - Don Quixote
• 1977 - Para gostar de ler
• 1979 - O melhor da poesia brasileira I
• 1981 - O pipoqueiro da esquina
• 1982 - A lição do amigo
• 1984 - Quatro vozes
• 1984 - Mata Atlântica
Aqui encontraremos não somente a poesia epigramática (curta e sentenciosa) e brincalhona da primeira geração modernista, mas o Drummond todo, o Drummond para quem poesia sempre foi expressão de impasse e angústia, mesmo da própria angústia da palavra que não vem:
Poesia
Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever .
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira
Os aspectos mais evidentes da herança modernista são:
• Versilibrismo: adoção do verso livre (sem métrica e sem rima);
• Oralidade: coloquialismo;
• Prosaísmo: adoção dos elementos da prosa;
• Supressão de pontuação convencional;
• Paródia: recriação irônica;
• Linguagem telegráfica: brevidade e concisão (poema-minuto);
• Poema-piada: concisão a serviço do humor e da ironia;
• Cotidiano: flashes da cidade grande, de província e da fazenda;
• Nacionalismo crítico: símbolos, mitos e lendas brasileiras;
• Visão prismática da realidade: recortes metonímicos;
• Frases nominais: enumeração de orações elípticas, sem verbo.
Examinemos agora o poema mais tautológico do autor, “No meio do caminho tinha uma pedra"
Carlos Drummond de Andrade - Uma análise
É claro que não alimento a doce ilusão de dissecar a estrutura lingüística de Drummond em uma página de texto. Contento-me com a possibilidade de discutir um ou outro caso das maravilhas do grande mestre.
O poeta de Itabira transitou por vários dos complicados territórios brasileiros da linguagem. Valeu-se muitas vezes do registro mais simples, coloquial - e por isso causou riso e escárnio -, mas foi erudito - no vocabulário e na sintaxe - em inúmeros de seus brilhantes e profundos textos.
Quando se sabe que a última edição do Aurélio dá exatamente 50 acepções para o verbo "ter" e nenhuma delas faz a mais pálida referência ao sentido de "existir" comum no Brasil há muito tempo, pode-se imaginar o que ocorreu com o memorável e inexoravelmente circular poema "No meio do caminho" ("No meio do caminho tinha uma pedra/ Tinha uma pedra no meio do caminho"), do primeiro livro (Alguma Poesia) de Drummond, publicado em 1930. As viúvas do parnasianismo ainda pululavam, e seu ideário lingüística castiço e lusitano, também.
O inegavelmente respeitável dicionário de Caldas Aulete também se negou a registrar o sentido de "existir' para "ter". Em mais de duas páginas que o verbo ocupa na obra, documentam-se as mais diversas expressões em que entra esse verbo. Mas nada de "Tinha uma pedra...” É. Mexer com a língua e a linguagem no Brasil não é tão simples como julgam alguns deslumbrados.
Apesar de muitas vezes ousar na linguagem, não se pode dizer que Drummond fosse tão apaixonado por experimentalismo lingüísticos. Mas ele não hesitava em subverter a sintaxe convencional ou mostrar erudição lingüística como em “Mundo grande”, em que diz: “Não, meu coração não é maior que o mundo. É muito menor. Nele não cabem nem minhas dores. (...) Só agora vejo que nele não cabem os homens. (...) Mas também a rua não cabe todos os homens(...)”.
Alguém pode achar que o poeta quis criar uma regência para “caber”, mas não é bem assim. Celso Luft diz que é possível esse verbo como transitivo direto. No trecho de “Mundo Grande”, CDA faz uso dessa sintaxe, quando lhe dá como sujeito o continente (a rua) e como OD o conteúdo (os homens)
Alguns talvez se perguntem até hoje se as orações introduzidas pelos vários “quês” de “Quadrilha” são restritivas ou explicativas. Nesse poema genial, CDA faz uso magistral desse pronome relativo. O “que, que retoma o antecedente – sem vírgula – projeta-o rapidamente na oração seguinte, dá ao poema o exato ritmo de uma quadrilha, dança em que os pares mal se formam e se desfazem. No poema de CDA eles mal se formam.
A modesta contribuição do pronome relativo “que”, na verdade, faz parte de mais uma das aulas de Drummond. Aulas de ritmo e de integração da estrutura morfossintática do texto com a mensagem pretendida.
Pasquale Cipro Neto
Revista Cult – set/99
José
José foi originalmente publicado no livro de mesmo nome em 1942. Na década de 70 virou música e se tornou tão popular que a expressão “E agora, José?” passou a ser usada como manifestação de perplexidade. Pode ser encontrado no livro A palavra Mágica, da Coleção Mineiramente Drummond (Editora Record, 1998). Este livro apresenta 40 poemas selecionados por Luzia de Maria, além de uma rápida biografia do autor e notas e comentários a respeito de grande parte dos poemas nele publicados.
A seguir, temos um dos vários poemas onde o autor “transforma” sua cidade natal em uma espécie de mito, evocando-a sempre como dolorida lembrança.
CONFIDÊNCIA DO ITABIRANO *
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e
comunicação.
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas que ora te ofereço:
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...
Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!
Carlos Drummond de Andrade
* Do livro SENTIMENTO DO MUNDO.
Drummond publicou centenas e centenas de poemas em mais de 30 livros (sem contar as antologias poéticas, edições de poesia reunida, livros infantis e de prosa). Ainda que você não seja um aficcionado pela obra de Drummond, por poesia ou mesmo que não goste de ler muito, irá reconhecer vários versos do poeta que passaram a fazer parte dos ditos populares e das citações em rodas de amigos.
Aula de Português
A linguagem
na ponta da língua
tão fácil de falar
e de entender.
A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, equipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, seqüestram-me.
Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.
O português são dois; o outro, mistério.
Aula de português é um dos poemas que compõem a trilogia Boitempo (1968, 1973 e 1979). Você pode encontrá-lo no livro A palavra Mágica, da Coleção Mineiramente Drummond (Editora Record, 1998). Este livro apresenta 40 poemas selecionados por Luzia de Maria, além de uma rápida biografia do autor e notas e comentários a respeito de grande parte dos poemas nele publicados.
O amor natural
O amor natural, de 1992 (Editora Record). O livro apresenta 39 composições em verso e uma em prosa. Quase todos os poemas são inéditos, à exceção de uns poucos publicados em revistas eróticas da década de 70. Foram guardados em segredo e confiados aos seus herdeiros para publicação após a morte do autor. Os textos são ilustrados por Milton Dacosta (1915-1988), parceiro de Drummond desde 1957, quando ilustrou a capa do livro de crônicas Fala, Amendoeira. O livro traz ainda o texto O erotismo nos deixa gauche?, no qual Affonso Romano de Sant’Anna analisa os versos eróticos e diz que O amor natural “é um livro que perturbará alguns, decepcionará outros e em outros reafirmará a admiração por Drummond”. Acredito que a maioria tenha ficado com a terceira opção.
Apresentaremos nesta seção algumas de sua criações.
O que se passa na cama
(O que se passa na cama
é segredo de quem ama.)
É segredo de quem ama
não conhecer pela rama
gozo que seja profundo,
elaborado na terra
e tão fora deste mundo
que o corpo, encontrando o corpo
e por ele navegando,
atinge a paz de outro horto,
noutro mundo: paz de morto,
nirvana, sono do pênis.
Ai, cama canção de cuna,
dorme, menina, nanana,
dorme onça suçuarana,
dorme cândida vagina,
dorme a última sirena
ou a penúltima… O pênis
dorme, puma, americana
fera exausta. Dorme, fulva
grinalda de tua vulva.
E silenciem os que amam,
entre lençol e cortina
ainda úmidos de sêmen,
estes segredos de cama.
A despedida
Em setembro de 1984 o cronista Carlos Drummond de Andrade despede-se de seus leitores com a crônica "Ciao":
"Há 64 anos, um adolescente fascinado por papel impresso notou que, no andar térreo do prédio onde morava, um placar exibia a cada manhã a primeira página de um jornal modestíssimo, porém jornal. Não teve dúvida. Entrou e ofereceu os seus serviços ao diretor, que era, sozinho, todo o pessoal da redação. O homem olhou-o, cético, e perguntou:
- Sobre que pretende escrever?
- Sobre tudo. Cinema, literatura, vida urbana, moral, coisas deste mundo e de qualquer outro possível."
Em 1987, Carlos ainda escreve sobre os mais diversos assuntos. Títulos como "A ilusão do migrante", "A loja feminina", "Aparição amorosa", "A grande dor das cousas que passaram", "Arte em exposição", são apenas "amostras" para indicar a variedade de temas que constituem e valorizam “FAREWELL", a despedida poética de Carlos Drummond de Andrade.
Bibliografia
Revista Cult - revista Brasileira de Literatura
Número 26 - Setembro de 1999 Ano III
LEMOS Editorial
Sites na Internet:
http://www.ibase.org.br/~ondaalta/carlos.htm
http://www.carlosdrummond.com.br/carlos/opcoes2.htm
http://www.secrel.com.br/jpoesia/drumm.html
http://www.carlosdrummond.com.br/
Juliana Pedroso Rodrigues nº 24
Mariana Nunes Azambuja nº 32
Sheila Luzia Santos Lima nº 36
Vanessa Reis Cristo nº 38
Turma 472/99
Disciplina: Português
Profª. Jurema C. V. Hélcia
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