terça-feira, 27 de novembro de 2012

FLORBELA ESPANCA



FLORBELA ESPANCA
 Análise Acadêmica por Gelza Reis Cristo
Comentário: escrever um poema é como fazer uma massa: a inspiração vem primeiro.


Confrontam-se aqui duas obras, duas poesias do mesmo título, de Florbela  Espanca.  As poesias, com o mesmo título: “EU”. Neste trabalho podemos estabelecer uma comparação entre os dois momentos do eu-lírico quando tenta buscar uma definição para si próprio, utiliza-se dos recursos da arte literária para formar a imagem de si mesmo. A poetisa busca através da arte construir uma definição do “eu” em marcas profundas, numa indefinição onde estabelece um conceito onde tenta encontrar a auto-definição por definição. “Sai a que no mundo anda perdida”. O pronome demonstrativo a (aquela), é usado para mostrar e denunciar ou definir algo. Qual a definição procurada e questionada?
Como a arte é valiosa, poucos vêm e poucos notam, ela se encontra em todas as direções, ora como sonho, ora sofrida e mal amada, ora nunca vista: morta. Todos passam e a cegueira não permite a visão do belo que parece triste e da dor não compreendida.                                                                                                                         Numa Segunda leitura podemos perceber nos versos de Florbela certo grau de distanciamento: o que, aquela que. Mas, quem é aquela quê?  Um eu-lírico que generaliza aquilo que se diz dele mesmo e alguma vez indetermina o que se diz. Por vezes se distância o “eu” do “eu” um sendo a essência e outro a mente. Há um confronto de valor e perdição, ora existe, ora não se sente. Por vezes sonha, por vezes sofre. Escuridão, incertezas, nuvem que passa sem ser notada e que se dissipou sem ser vista ou notada. Mostra um “eu” latente que... No "mundo anda perdida” e em outro tempo diz que é um “eu” que não tem norte, sem direção e sem objetivo.

                                               EU...

                        Eu sou a que no mundo anda perdida,
                        Eu sou a que na vida não tem norte,
                        Sou a irmã do sonho, e desta sorte.
                        Sou a crucificada... a dolorida...

                        Sombra de névoa tênue e esvaecida,
                        E que o destino amargo, triste e forte,
                        Impele brutalmente para a morte!
                        Alma de luto sempre incompreendida!...

                        Sou aquela que passa e ninguém vê...
                        Sou a que chamam triste sem o ser...
                        Sou a que chora sem saber por quê...

                        Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
                        Alguém que veio ao mundo pra me ver,
                        E que nunca na vida me encontrou!

                                               X

                                               EU

                        Até agora eu não me conhecia,
                        Julgava que era Eu e eu não era
                        Aquela que em meus versos descrevera
                        Tão clara como a fonte e como o dia

                        Mas que eu não era Eu não sabia
                        E, mesmo que o soubesse, o não dissera...
                        Olhos fitos em rútila quimera
                        Andava atrás de mim... e não me via!

                        Andava a procurar-me __ pobre louca! __
                        E achei o meu olhar no teu olhar,
                        E a minha boca sobre tua boca!

                        E esta ânsia de viver que nada acalma,
                        É a chama da tua alma a esbrasear
                        As apagadas cinzas da minha alma!
                                                                                                    
No segundo poema, acontece o confronto do “eu” que não se encontrava e não era visto, com o “eu” real com a alma em chamas. O passado estava sendo observado como uma sombra de loucura que passara e dava espaço para o ver e o sentir. O “eu-lírico” se apresentava como um espelho afogueando a sua alma que queria viver e apagar as nevoa do passado dando espaços para as suas qualidades, mostrando-se um ser que tem sentimentos e é capaz de ver a vida como o bem mais precioso. O passado passou a ser algo questionável dentro dos novos valores. A razão do “penso, logo existo” foi notada no brilho do olhar pelo olhar e na visão do passado apenas como cinzas que se dissiparam nas nuvens do passado.

                        Como síntese, o primeiro poema é a morte a passar pela vida, e o Segunda como sendo a vida ressucitando um “EU” que no passado havia morrido. Nascia uma luz de entendimento entre o “Eu” mais o eu-lírico onde a vida (com sonhos e ilusões) vencia a morte vista como cinzas do passado.
“-... rútila quimera”. Mesmo que se conhecesse ainda tinha sonhos e ilusões. Na
poesia II o sentido do vazio foi achado e houve a necessidade de completar-se um ao outro: “até agora eu não me conhecia”. Buscando a arte como refugio.                

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